Uma Mesa Com Cinco Anciões

Eram cinco em volta de uma mesa disforme. Um velho e barbudo, um velho de careca lustrosa, um velho e gordo, um velho magrinho e um velho de barba e cabelos longos. A mesa parecia que havia sido qualquer coisa antes de virar uma mesa. Parecia que a haviam posicionado da maneira correta, jogado uma toalha por cima e “Voilà!” Como teria dito um deles em sua língua. Já os cinco, a única semelhança entre eles era o fato de serem velhos, cabeças duras e gostarem de uma bela e acalorada proza.

“Mas você não pode falar que somos apenas nós cinco os habitantes desse mundo.” O velho e gordo levantou-se da sua cadeira, coisa que jamais fazia, coisa que ele mesmo dizia.

“E por que não?” O velho magrinho elevou a si e seu tom de voz. “Você vê mais alguém por aqui?”

“Mas existem outros como nós! Já vimos antes.” O velho de careca lustrosa sacudia suas mãos involuntariamente.

“Faz tempo que não os vejo e esse mesmo tempo já deve tê-los levado.” O velho magrinho não se dava por vencido.

“Mas e fora do nosso mundo?” O velho de barba e cabelos longos estava pensativo, alheio àquela discussão.

“O que você pressupõe quando diz nosso mundo?” O velho e barbudo puxou sua cadeira e sentou-se de frente para dar início a uma nova discussão.

“Vocês não veem esses pontos brancos no céu noturno? Não seriam outros mundos brilhando?” O velho de barba e cabelos longos começava a explanar sua teoria. “Será que o nosso brilha assim também?”

Os outros anciões se entreolharam e riram.

“Se nosso mundo brilhasse não haveria noite!” O velho e gordo desmentiu a teoria sentando-se novamente.

“Não é isso.” O velho de barba e cabelos longos ainda tentou se explicar. “Quero dizer que deva haver vida em outros locais, em mundos como esse.”

“Pode ser que sim, mas também pode ser que não.” O velho magrinho se preparava para argumentar. “E se o universo for muito novo para ter tido tempo da vida nascer em outros lugares?”

“Ou muito velho e toda a vida já se fora…” Complementou o velho e barbudo para ganhar a aprovação do velho magrinho. “restando apenas nós cinco…” Continuou para também buscar a aprovação do velho e gordo.

“Vocês são velhos e tolos! Impossível conversar com vocês!” O velho de barba e cabelos longos se irritou.

“Eu vou falar o que é tolice.” O velho magrinho não desperdiçava uma chance. “Tolice é um velho que constrói um casebre velho, caindo aos pedaços e no meio de um lago.”

“Ei!” O velho de barba e cabelos longos indignou-se. “Dobre sua barba antes de falar do meu casebre, digo, da minha choupana!”

“E ainda obriga seus visitantes a virem espremidos num barquinho.” O velho e barbudo lembrou bem.

“Aquilo é um barquinho? Achei que fosse um pedaço de tronco oco e podre usado de barco…” O velho e gordo pôs-se a pensar.

“Eu vim nadando…” O velho de careca lustrosa, que havia se ausentado, finalmente chegou na mesa com mais chá.

“Oras carolas, mas que culpa tenho eu se marcamos aqui na nossa última prosa?” O velho de barba e cabelos longos se eximia da culpa.

“Em nosso encontro centenário?!” O velho e barbudo coçou a cabeça.

“No nosso último encontro eu ainda tinha cabelo…” O velho de careca lustrosa ainda tentava se colocar na conversa.

“Você era o velho de cabelos longos e crescentes, não?” O velho e gordo perguntou.

“Sim, era ele!” O velho magrinho respondeu na frente do velho de careca lustrosa. “Mas no nosso último encontro ele já não tinha mais cabelo, lembram-se? Até fizemos uma votação para mudar o nome dele.”

“Sim, é verdade!” O velho e gordo sorriu ao relembrar o fato.

“Eu preferia meu nome de antes…” O velho de careca lustrosa mostrou-se introspectivo.

“Ora, vejam só o que vocês, velhos tolos, fizeram. Vocês vem aqui na minha choupana, que construí com muito esforço e a mantive intacta. Vocês escracham ela e depois zombam do nosso ilustríssimo amigo que tem uma das carecas mais invejadas do nosso mundo.” O velho de barba e cabelos longos ia parar por aí, mas como ninguém ousou contra argumentar, continuou. “E ainda discordam da minha sábia teoria dos mundos e ainda por cima vem me falar que somos somente cinco nesse mundo?”

“Pera aí!” O velho e gordo levantou-se da cadeira novamente. “Somos só cinco mesmo!” Deu um murro na mesa com suas duas pesadas mãos. O chá que o velho de careca lustrosa havia trazido voou para cima caindo em barbas, carecas e cabelos desgrenhados.

“Olha só o que você fez, seu velho tolo desajeitado.” O velho magrinho tentou virar a mesa, mas só conseguiu realmente quando o velho e barbudo o ajudou.

“Vocês estão destruindo minha choupana.” O velho de barba e cabelos longos se desesperou.

A confusão foi geral. Teve quem recolheu o chá esparramado no chão dentro de uma xícara para jogar no companheiro. Teve quem se aproveitou da distração do outro para dar uma leve empurrada com o pé e vê-lo cair no lago. Teve quem entrou com os pés sujos na choupana e voltou correndo gritando. Teve quem deu um tapa numa careca lustrosa e disse que fazia tempo que queria fazer aquilo. Teve quem se colocou de pé em cima de sua cadeira e começou a dar lições de moral e bons costumes.

Assim, como o chá, aqueles velhos eram bons em esparramar suas palavras. E assim o fizeram até que uma melodia suave adentrou o ambiente.

O velho e gordo arrumou sua cadeira para sentar-se novamente, mas não sem antes ajudar o velho magrinho a reposicionar a mesa. “Que bela melodia…” ousou dizer alguma coisa.

“Não falei que faltava alguém…” O velho magrinho sorriu.

“O sexto chegou…”

A discussão cessou. Os cinco, sentados e bem comportados à mesa, bebericaram o pouco de chá que ainda havia restado e que o velho de careca lustrosa fez o favor de buscar, cachimbaram e apreciaram cada um sua própria solidão rodeada pela solidão dos outros velhos “tolos”.

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